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sexta-feira, 1 de maio de 2009

Dia do Trabalhador (2) - Antologia

calçada de carriche

Luísa sobe,
sobe a calçada,
sobe e não pode
que vai cansada.
Sobe, Luísa,
Luísa, sobe,
sobe que sobe
sobe a calçada.

Saiu de casa
de madrugada;
regressa a casa
é já noite fechada.
Na mão grosseira,
de pele queimada,
leva a lancheira
desengonçada.
Anda, Luísa,
Luísa, sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.

Luísa é nova,
desenxovalhada,
tem perna gorda,
bem torneada.
Ferve-lhe o sangue
de afogueada;
saltam-lhe os peitos
na caminhada.
Anda, Luísa.
Luísa, sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.

Passam magalas,
rapaziada,
palpam-lhe as coxas,
não dá por nada.
Anda, Luísa,
Luísa, sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.

Chegou a casa
não disse nada.
Pegou na filha,
deu-lhe a mamada;
bebeu da sopa
numa golada;
lavou a loiça,
varreu a escada;
deu jeito à casa
desarranjada;
coseu a roupa
já remendada;
despiu-se à pressa,
desinteressada;
caiu na cama
de uma assentada;
chegou o homem,
viu-a deitada;
serviu-se dela,
não deu por nada.
Anda, Luísa.
Luísa, sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.
.
Na manhã débil,
sem alvorada,
salta da cama,
desembestada;
puxa da filha,
dá-lhe a mamada;
veste-se à pressa,
desengonçada;
anda, ciranda,
desaustinada;
range o soalho
a cada passada;
salta para a rua,
corre açodada,
galga o passeio,
desce a calçada,
desce a calçada,
chega à oficina
à hora marcada,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga;
toca a sineta
na hora aprazada,
corre à cantina,
volta à toada,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga.

Regressa a casa
é já noite fechada.
Luísa arqueja
pela calçada.
Anda, Luísa,
Luísa, sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada,
sobe que sobe,
sobe a calçada,
sobe que sobe,
sobe a calçada.
Anda, Luísa,
Luísa, sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.


António Gedeão, in 'Teatro do Mundo'

4 comentários:

Anónimo disse...

Brilhante! Bom dia de Maio.
João Martins

Ana Maria disse...

Olá, João Martins:

Tomo o cumprimento, como é evidente, para quem o merece: o grande Rómulo de Carvalho, o nosso Gedeão.
Entretanto, enquanto pudermos, deixemos que o sonho comande a vida...

Para si, também, um bom dia hoje, amanhã e sempre.

Ana Maria

Lourenço Anes disse...

Também quero deixar-lhe uma palavrinha, João Martins:

Mão amiga trouxe ao meu conhecimento um comentário seu, feito ao blogue «Sebastião» em que o senhor dizia que se não fosse esse blogue e o «Calçadão de Quarteira» a política era algo que ficava no segredo dos partidos e dos políticos profissionais.

Honra-nos que o autor do MACLoulé, o melhor e mais interessante blogue do concelho, assim pense; mas devo dizer-lhe que, muitas vezes, os comentários que recebemos nos trazem desilusão.

Parece que as pessoas se preocupam mais com as coisas comezinhas, com as tricas e mexericos do que com os factos e os actos que lhes dizem directamente respeito.

A maior parte das vezes preferem “comentar” as pessoas (quando não preferem recorrer ao insulto – que sempre apago) e esquecem-se de exprimir as suas opiniões sobre aquilo que é efectivamente importante.

Não estou a “ensinar” o padre-nosso ao vigário; mas gostaria de ter uma sugestão: como poderemos nós “envolver” os nossos conterrâneos, como poderemos incentivar a discussão política, a discussão social? Ou “isto” já não tem remédio?

Um abraço

L. Anes

Anónimo disse...

Boas caro Lourenço. Agradeço a simpatia pelo macloulé. Sobre a questão que levanta penso que a força da blogosfera é feita um pouquinho por cada um de nós. Penso que os blogues alargaram claramente o espaço público da discussão democrática, embora sejam apenas um veículo entre muito outros que fazem o espaço público (Tv, Rádios, jornais, outros veículos na internet, cafés, etc). É claro que a cidadania em portugal e o gosto pela discussão e participação na Res Pública é muito baixo e isto é um caminho que tem que ser feito progressivamente. Nesse sentido não se admire nem se incomode com os ataques pessoais ou as interpretações pessoalizadas. Roma e Pavia não se fizeram num dia e o caminho faz-se caminhando. O calçadão ajuda a tornar públicos e visíveis assuntos que são do interesse de todos nós e que muitas vezes a maior parte dos jornais do concelho teimam em ignorar. Nesse sentido, o Calçadão cumpre a sua missão. A mais não é obrigado. Ir mais longe só fundar um movimento de cidadãos que gostem de discutir e intervir nas coisas da política. Não sei se há condições de cidadania para isso. Um grande abraço!
João Martins