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domingo, 21 de outubro de 2007

CRÓNICA DE HUMOR INGÉNUO

lisboa em camisa no séc XIX
Imagem: «La Place de l'Europe, temps de pluie», de Gustave Caillebotte
----- “[…] Pela manhãzinha, muito cedo, a D. Josefina levantou-se para fazer a sua barrela. Foi para a cozinha e, como a luz era ténue, esbranquiçada, da alvorada, coada pela janela estreita que deitava para o saguão, alumiasse muito pouco, D. Josefina teve de acender o candeeiro de petroline para fazer as suas lavagens.
----- Angélica estava ainda no seu primeiro sono e acordou-a a bulha que fazia a sua cunhada chapinhando em água morna, alagando a cozinha, com uma grande respiração ofegante. Entremeada duns «Ah!... ah!...» consolados, das pessoas pouco habituadas ao contacto com a água. Angélica esteve um momento assustada, de ouvido à escuta, com os olhos fixos no tecto de estuque branco, onde a luz da lamparina de azeite punha sombras esquisitas, rectangulares, a ver se distinguia o que vinha a ser aaquele barulho confuso que a acordara.
----- -- Nada! Decididamente, é gente que anda lá dentro.
----- E, muito assustada, a tremer de medo e de frio, saltou de sua cama, em camisa, e foi abanar seu marido.
----- -- O que é?... O que aconteceu? – resmungou Justino, com os olhos meio fechados e voltando-se na cama.
----- -- Anda gente lá dentro – disse baixinho Angélica, aterrorizada.
----- -- Ora adeus! Isso são ratos!... Dorme, dorme – e voltou-se para o outro lado, aconchegando-se na roupa.
----- -- Quais ratos, homem! Mexe-te… Credo! Que empada de homem! Não ouves…
----- E nisto, Josefina, com as suas tremuras ao lavar o pescoço, atirou ao chão o regador, que estava em cima do banco da cozinha.
----- -- É verdade! – disse Justino, já muito assustado, sentando-se na cama – Já sei o que é… São ladrões!
----- D. Josefina, baixando-se para apanhar o regador, apanhou também um golpe de ar e espirrou.
----- -- E ladrões constipados! – continuou amedrontado Justino – Vê lá se a porta do nosso quarto está bem fechada…
----- -- Mas vai lá dentro ver o que é…
----- -- Nada, nada… põe aí cadeiras à porta e apita.
----- E, saltando da cama, pôs-se a apitar, batendo na parede contrária ao seu leito, qyue era a do quarto da D. Josefina.
----- -- Ó mana! Ó mana! Acorde e apite, acorde e apite […]”.
in «Lisboa em camisa» de Gervásio Lobato, Lisboa 1850 / 1895.
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